domingo, 23 de janeiro de 2022

 

BENJAMIM

                                                                              

                                                                             Conto de Eliane Dutra Fernandes

 

O vento balançava as folhas com uma velocidade descomunal, os galhos despencavam pelo impulso da ventania e os campos floridos se misturavam com terras, galhos, folhas e pétalas de rosas. Algo acontecia mostrando um fenômeno que estava para vir. A imaginação apavorava o pequeno Benjamim, seus óculos já embaçados não o impediam de enxergar o que à sua frente aparecia. O real o confundia com a sua mente fértil de criança observadora, quieta, calada, surpreendente e até um pouco estranha. Naquele caminho agora íngreme, dificultoso e sem a bela paisagem que antes exibia, surgia  espantosamente de um fumaçeiro aquele bichinho de olhos compridos e boca larga, orelhas grandes e antenas pontiagudas na cabeça. Uau!

Benjamim não conseguia falar nem gritar, mas de boca entreaberta e tremendo sem parar, começava a ativar seus neurônios, que em conexão geral com aquele espaço, aquele momento e aquele tipo sobre humano, já fazia as coordenadas para um entendimento racional e profundo.

O pensamento o levava a um diálogo telepático, silencioso, mudo, ardente e originalmente superior a qualquer outra forma de contato conhecida.

              - O que queres e pra que viestes ?

            - Eu vim para te ver e castigar tal mundo ruim.

- Não sabes o que dizes nem conheces o meu mundo...

            - Mostra-me, garoto, então!

Para aquele pequeno orelhudo o mundo apresentava uma estampa suja, feia, as pessoas desumanas, assassinas, corruptas, ladrões de vida e de bens materiais, o ambiente destruído, queimadas, secas...

De mansinho tudo ia clareando, a fumaça se dissolvia e o Benjamim, solto e livre de traumas, seguia calmo e feliz para sua casa. Terá sido sonho? dizia ele. Claro que sim e ria, ria, ria...

No caminho de casa lá estava o velhinho que atenciosamente Benjamim protegia. Protegia-o nos dias de chuva, levando-o para a garagem de sua casa, dava-lhe roupas quentes e facilitava-lhe um banho, comida e boa dormida. Benjamim, no entanto, não tirava do seu pensamento aquele ser orelhudo, pequeno, mas que não lhe dava medo. Como gostaria de vê-lo novamente, Terá sido sonho?

Na escola,  os colegas o olhavam e sempre alguém dizia “que estranho este Benjamim”. Olha mesmo o que está a fazer. Em vez de brincar no recreio está ele ajudando ao mais preguiçoso da sala nos seus deveres, está lá, tentando ensinar alguma coisa. Mas veja agora! Ele não se defende nem das ofensas que fazem a ele. Hoje mesmo o chamaram de cego pelos óculos de grau que ele usa, o chamaram de desengonçado e magrelo. É mesmo um tonto, diziam. Professora, professora, como este lerdo tira notas tão altas?

Enquanto isso, Benjamim organizava um pequeno local para ensinar a uns pequenos que tinham dificuldades  em aprender. Ao mesmo tempo,  com  um dos seus amigos resolveu  fazer um movimento e criar também uma horta na Escola e em outra Escola vizinha  compartilhar a ideia  e convencer a diretora a plantar fruteiras com a ajuda de alguns pais que entendiam de plantações.

            Um dia, Benjamim passava por uma das ruas quando observou um grupo pequeno de pessoas ao redor de um espaço  conversando,  gesticulando e apontando para o chão.  Que bom vê-los aqui! Disse o Benjamim.  Será que tiveram a mesma ideia que eu? Uma linda praça poderia surgir neste recanto tão belo.  Sim, sim, disseram, era isso mesmo que estávamos a discutir.

Por trás de uma árvore frondosa, exuberante  e majestosa, Benjamim tornou a ver aquele orelhudo  desengonçado, de  dedões azuis  acenando para ele. Não estou sonhando, será que não estou sonhando? Ele está me observando, me seguindo.

Uma nova visão deslumbrou o tal visitante que de tão pelado e magrinho que era, mostrou-se como um lindo Anjo encantado e cheio de doçura. O que teria mostrado o Benjamim de tão maravilhoso para essa transformação metamorfoseada?

Um mundo encantado foi aparecendo em uma tela viva, crianças corriam animadas, pais beijavam e cuidavam de seus filhos com amor e complacência, mendigos recebiam comidas, roupas, um leito para dormir, os gatinhos e cães amaciados pelas mãos dos donos miavam e latiam harmonicamente. Os idosos felizes recebiam o carinho dos filhos e das meigas cuidadoras. O verde resplandecia pelos campos  do  planeta  terra, as águas azuis do mar, num indo e vindo, traziam hinos de amor e de doutrinação, as orações aconteciam em uma prova de santidade humana.

Um outro conceito de mundo  surgia  com sonoridade. A  música se elevava em  caminhos mágicos, quantas reservas ambientais, quantas  pessoas boas, magníficas,  maravilhosas, meigas, gentis, amorosas e caridosas. Crianças que nascem como esperança para um  mundo cada vez  melhor. Você me pediu que eu te mostrasse meu mundo. Eis aqui, disse Benjamim ao seu pequeno amigo. Hum! Hum! sussurrava o Anjo em devaneio sublimado em  uma nuvem branca e gloriosa.

Drogados e marginais, assassinos , homens sem caráter, ladrões e mentirosos, invejosos e ambiciosos, destruidores de ambientes, onde estão, cadê, então? Perguntou o Anjo, admirado.

Benjamim com a sua inteligência de menino Nerd, sem qualquer  interesse, ambição ou  mesmo temor, mostrou ao bichinho orelhudo, agora Anjo, que a terra não era aquilo que ele se acostumara a ver e que destruir ou castigar levaria o planeta a um mundo  de pó, de partículas que se perderiam no Universo da criação Divina. E de braços abertos fitando aquele augusto Anjo, traduzia o seu sussurro  Que o mundo é mundo, é vida, é beleza, é tela em que, em construção multicolorida, o  Criador  lentamente desliza os seus pincéis e o vai tornando estrela da perfeição e de  amor eterno”.

Enfeitiçado  Benjamim foi vendo o Anjo, que em carruagem exuberante, rodeado por uma luminosidade áurea,  ascendia  apresentando no azul  límpido do céu um quadro de muito exotismo, ali retratando o Planeta Terra em versão de esperança futurista, uma pintura  divinal, extrafísica, cercada de  palavras sonoras, policromadas bem assim: PLANETA/TERRA/ESPERANÇA/ESPIRITUALIDADE.

 

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